SANTIAGO - Em 2010, o mundo parou duas vezes para ver o Chile. Primeiro, um terremoto devastador. Depois, um resgate histórico de mineiros. Com o país em evidência, estável economicamente e moderno, Santiago passou a brilhar como nunca. Tanto que foi eleita pelo "New York Times" como o destino número um para ser visitado em 2011. Além dos bons programas clássicos de sempre, como a visita ao Mercado Central, a exploração das delícias marinhas e o roteiro nerudiano, que vai da boemia do bairro de Bellavista até algumas praias próximas, a capital chilena está cheia de novidades, entre hotéis, restaurantes, atrações culturais e marcos arquitetônicos (o futuro maior prédio da América Latina está sendo construído lá). Para lá deste perfil, já suficientemente interessante para os turistas, Santiago também ganha pontos pelas atrações nos arredores: afinal, praias, estações de esqui e vinícolas estão a um pulo. A cidade também acaba entrando na pauta de muito viajante a caminho dos destinos tão diferentes entre si que há no país, como a Ilha de Páscoa, o Deserto do Atacama e a Patagônia. Para se voar até estes lugares, é preciso passar pela capital. E, cada vez mais, Santiago não é apenas um ponto de conexão, mas parte importante do roteiro. E se não é, deveria ser...
À noite, desenhos no Rio Mapocho
Não é difícil entender as razões que levaram Santiago a ganhar destaque no mundo do turismo nos últimos anos. Eles estão investindo e se esforçando para isso. Os resultados aparecem. A novidade mais recente, lançada há cerca de duas semanas, é o espetáculo noturno do Rio Mapocho, que corta a cidade: uma intervenção artística de autoria de Catalina Rojas, que criou desenhos para serem projetados nas águas turvas do rio, que assim ganha uma linda coloração.
Obras de infraestrutura facilitaram bastante a vida dos turistas. Largas avenidas e um incrível túnel que atravessa boa parte de Santiago, evitando o tráfego mais pesado, possibilitam um acesso tranquilo ao aeroporto (dependendo do dia, não se gasta mais que 15 minutos para ir do Centro até lá). O metrô foi outro investimento muito bem-vindo, e é possível visitar praticamente todos os pontos de interesse usando o serviço - dá até para se visitar algumas vinícolas nos arredores, como a Santa Carolina, a Cousiño-Macul e a Concha y Toro, combinando o metrô com uma curta corrida de táxi (com preço inferior a R$ 5). São cinco linhas, com mais de 90 estações, limpas e bem cuidadas.
Entre as boas novas dos últimos anos, também está a expansão da cidade em direção a Las Condes, enclave mais chique da cidade, com shoppings, hotéis, boates e restaurantes de alto padrão. Não à toa, essa região foi a escolhida por algumas redes internacionais de hotelaria de luxo que se instalarem ali, como W, Hyatt e Marriott.
Além das melhorias e novidades, Santiago tem outros bons trunfos para atrair turistas: a criminalidade é muito inferior e as ruas são bem mais limpas, por exemplo, se compararmos com Buenos Aires. E, cá entre nós, não é toda cidade que tem vista para os Andes. Para o gourmet, há os vinhos chilenos, e os peixes e frutos do mar, sempre muito frescos.
Há os bairros, um para cada perfil. Las Condes, como já foi dito, sacia o apetite consumista. Lastarria, com seus museus, universidades, cafés, bares, ateliês, galerias de arte e lojas de moda e design, é o recanto mais cool de Santiago. Bellavista, por sua vez, é a zona boêmia, tendo na Calle Pio Nono o seu eixo central, abarrotado de bares sempre cheios de jovens - mesmo numa tarde em dia de semana. Acima de Bellavista está o Cerro San Cristóbal, que se pode subir de teleférico ou funicular. O Centro ainda guarda uma preciosa arquitetura antiga em alguns emblemas da cidade, como o Mercado Central, o Palácio de la Moneda, a Catedral Metropolitana, o Palácio Errázuriz (onde hoje funciona a Embaixada do Brasil) e a Confiteria Torres, inaugurada em 1879.
Cidade recebe restaurante Armani
Na minha primeira visita ao Chile, cheguei ainda pela manhã. Largamos as coisas no hotel e fomos correndo para o Mercado Central. Vimos muitas barracas para já irmos nos familiarizando com os pescados. E, como fazem nove em cada dez turistas, nos sentamos no restaurante Donde Augusto para almoçar. Não que tenha sido ruim. Mas estou certo de que foi a pior refeição que fiz na capital chilena, naquela e nas visitas seguintes (quatro, no total). E está também entre as mais caras. Ou seja: o Mercado Central é um passeio, mas fazer uma refeição ali é bobagem - até porque a cena gastronômica chilena está vivendo um ótimo momento.
Quem desejar comer em um cartão-postal pode seguir em direção à Confitería Torres, perto dali, ainda na zona central da cidade. O restaurante, inaugurado em 1879, é um endereço famoso na cidade há décadas, frequentado por escritores, empresários, políticos e turistas. O ambiente é classudo e elegante, com bancos de couro vermelho, muitos quadros em preto e branco nas paredes, retratando Santiago e seus personagens, bar de madeira (com uma bonita iluminação atrás do balcão) e um cardápio igualmente clássico, que pode começar com empanadas e chupe de locos (um tipo de marisco, de carne branca e muito saborosa, que também é servido em forma de salada à vinagrete com folhas, muito bom). Entre as especialidades, além de pratos de peixes, está o filé marinado no coentro. Vale lembrar que foi inventado ali por um ex-presidente o sanduíche que leva o seu nome, Barros Luco, que leva queijo e carne, hoje difundido em todo o país. E quem quiser, pode deixar para visitar só para um chá da tarde.
Outro endereço gastronômico histórico é o restaurante Venezia, no bairro boêmio de Bellavista, o favorito do poeta Pablo Neruda, Nobel de Literatura de 1971. É um espaço grande e meio caótico, frequentado mais por chilenos do que pelos turistas, com mesas cobertas por toalhas quadriculadas. Não espere sofisticação, mas uma comida honesta em ambiente pitoresco, decorado com bandeiras de países e times de futebol, garrafas de vinho antigas e muitas fotografias, grande parte delas do escritor que deu notoriedade ao lugar. Talvez este seja o lugar mais indicado para se provar o lomo a lo pobre, um filé grelhado coberto com dois ovos e servido com batatas fritas e cebola refogada longamente, até se transformar numa espécie de purê, levemente caramelizado.
Também clássico é o Divertimento Chileno, dentro do Parque do Cerro San Cristóbal. A comida campestre preparada com correção é em muito valorizada pelo cenário bucólico, rodeado pela mata, com um lindo jardim. Há agradáveis mesas do lado de fora do casarão, decorado com objetos de fazenda. Apesar do clima rural, os pescados também brilham, em receitas como o ajillo mixto (camarões, lulas, tomates e champignons com temperos e queijo de cabra) e a trilogia de ceviches com os peixes do dia.
Mas a gastronomia de Santiago não se resume a endereços tradicionais. Pelo contrário: nos últimos anos, estão abrindo novas casas, como o nipo-peruano Osaka, instalado no Hotel W, e o Emporio Armani Ristorante (existem muitos cafés Armani, mas restaurante só mesmo em Nova York, Tóquio e, mais recentemente, Santiago - a cidade está mesmo com tudo).
A cidade foi a terceira a ganhar uma filial do Osaka (as outras duas casas da rede ficam em Lima e Buenos Aires). O cardápio mescla pratos do Peru e do Japão quase sempre com alguma criatividade, e sempre usando ingredientes locais. Explore as entradinhas, como o rolinho de peixe branco recheado com alface em tirinhas, abacate e molho picante. Ou os cevichitos, servidos em pequenas colheres, como o de polvo, banana caramelada e manga, temperados em molho delicioso e um toque crocante.
Enquanto isso, restaurantes com alguns anos de vida, como o Europeo, estão cada vez melhores. No cardápio criado pelo chef Carlos Meyer Anwandter, que sempre se renova, a cozinha é de base francesa, com influências de outros países do continente, como Itália e Espanha. No menu, foie gras, trufas, lagosta e carnes de caça, com preparo certeiro e apresentação cuidadosa. Reserve. E não deixe de ir.
Nos arredores, escolha entre as praias, as vinícolas ou o esqui
Santiago tem uma virtude rara: é uma cidade cercada de atrações por todos os lados - muito diferentes entre si. A oeste, para os dias de verão, temos as praias: Viña del Mar e Valparaiso são apenas as duas mais famosas. A leste, para quando a neve chegar, estão as estações de esqui: Valle Nevado, El Colorado e La Parva, bem perto da capital. Ao norte e principalmente ao sul (no Vale do Maipo, em especial) estão as vinícolas, para serem degustadas durante todo o ano (mas durante o verão e parte do outono, com as videiras carregadas e o trabalho de colheita, é muito mais interessante fazer o passeio). E ainda há os cassinos.
Para nós, brasileiros, as vinícolas e as estações de esqui são muito mais relevantes, claro. Mas, não custa lembrar, mesmo aos que não querem se banhar nas águas frias do Oceano Pacífico: o litoral chileno tem lá o seu charme, isso tem.
A começar por Viña del Mar, um típico balneário turístico urbano que concentra bons hotéis e restaurantes e tem atrações que estão além de praia (elas são até bonitas, mas cá entre nós: sair do Brasil para ir à praia no Chile é o mesmo que sair do Chile para beber vinho no Brasil). Na cidade há um belo Jardim Botânico, construções históricas, museus e parques bastante agradáveis.
No mês de fevereiro, por exemplo, acontece o Festival Internacional da Canção de Viña del Mar, sempre com convidados ilustres. Neste ano, por exemplo, vão se apresentar Roberto Carlos (22/02), Sting (25/02) e Alejando Sanz (26/02), entre muitos outros.
Bem perto dali, está a cidade de Valparaiso. Assim como o bairro de Bellavista, um lugar adorado por Pablo Neruda (uma de suas antigas casas abertas aos visitantes está lá: chama-se la Sebastiana). Apesar de ser uma cidade portuária, o casario colorido que desce pelas encostas da montanha (com acessos por elevadores tipo plano inclinado) dá um certo charme ao lugar.
O que faz mesmo sucesso com os brasileiros são as vinícolas e estações de esqui. Os vinhedos, além de estarem muito perto da capital (a Cousiño-Macul está praticamente dentro de Santiago), propiciam uma visita que vai além da bebida: são as chamadas "bodegas históricas", como Santa Rita, Concha y Toro, Santa Carolina e a própria Cousiño-Macul, todas fundada ainda no século 19 e instaladas em casarões antigos lindíssimos, com destaque para as caves subterrâneas imensas. Outra vantagem de se visitar essas vinícolas é o fácil acesso: basta pegar a Linha 4 do metrô e descer na estação mais próxima e depois pegar um táxi para uma curta viagem (para a Santa Carolina, por exemplo, são menos de dois minutos de trajeto a partir da estação de metrô).
Todas as quatro recebem visitantes e o programa é bem parecido, seguindo um mesmo roteiro. Primeiro, um tour, começando pelos vinhedos, passando pela área onde estão os tanques de fermentação, e terminando nas salas de barrica, sempre lindas. Em seguida, visita às lojinhas. Não deixe de reservar pelo site, porque muitas vezes não há mais vaga. Às vezes, a degustação é apenas no final do passeio, como na Santa Rita. Em outras, a prova dos vinhos vai acompanhando o tour, como na Santa Carolina (os brancos são servidos ao ar livre, no jardim, e os tintos, dentro da bodega, na sala de barricas).
As vinícolas com melhor estrutura para os visitantes são a Santa Rita (com restaurante, o Doña Paula, muito bom, hotel e até um museu) e a Concha y Toro (com restaurante, bar de vinhos e uma boa lista de rótulos vendidos em taça: na nossa visita, por exemplo, havia um raro Don Melchor 1988).
Por fim, as estações de esqui. Algumas delas também estão quase dentro de Santiago. Saindo do Centro, em cerca de 15 minutos, já estamos na Cordilheira dos Andes. É tão perto que é comum chilenos e turistas subirem a montanha de manhã, passar o dia esquiando, e voltar no fim do dia para Santiago.
ONDE FICAR:
Hotel W: Diárias a partir de US$ 320. Isidora Goyenechea 3000, Las Condes. Tel. (562) 770-0000. www.starwoodhotels.com
Grand Hyatt: Diárias a partir de US$ 300. Avenida Kennedy 4601, Las Condes. Tel. (562) 950-1234. www.hyatt.com.br
ONDE COMER:
Astrid y Gastón: Antonio Ballet 201, Providência. Tel. (562) 650-9125. www.astridygaston.com
Confitería Torres: Alameda 1570, Centro. Tel. (562) 688-0751. www.confiteriatorres.cl
Divertimento Chileno: Av. El Cerro s/n, Parque Metropolitano. Tel. (562) 233-1920. www.divertimento.cl
Europeo: Alonso de Córdova 2417, Vitacura. Tel. (562) 208-3603. www.europeo.cl
Osaka: No hotel W. Tel. (562) 770-0000.
Venezia: Pío Nono 200, Bellavista. Tel. (562) 737-0900.
Bruno Agostini - O Globo (Boa Viagem)
Nenhum comentário:
Postar um comentário